31.8.05
falling at your feet
sabes?, amo-te. é nessa vala
que cavo, fundo, a minha
mortalidade. o que espero?,
espero a confirmação, não
a ressurreição, não a vida
para a corrupção.
e sabes?, se morrer assim, morro
exacto. pois ainda me espanta
a nudez dos teus pés. s. d’o.
30.8.05
exit. na fuga, a variável mais relevante não é o modo de fugir ou o destino, mas o que se abandona, a dúvida do regresso. 3.
29.8.05
27.8.05
uma forma de dizer a ausência. a palavra começa no lugar onde os gestos ainda não são ou já não são possíveis. 3.
26.8.05
crepúsculo. escrevo para ela. uma derradeira vez pronuncio. ela não me ouve. amo-a, ainda assim. vou amar. o fim estende-se mais. escrevo para ela. como a casa vazia. como a pele que salta, mão no pulso. sangue. incêndio. não solidão. escrevo para ela, alguém. mas esta é uma carta para ninguém, se sei. uma derradeira vez pronuncio. tarde. é já tarde. mesmo se diante existe tanto tempo, o futuro. uma derradeira vez pronuncio. amo-te. e repito. s. d’o.
25.8.05
pelas mãos de galateia. a mais íntima das intimidades acontece na província da loucura. 3.
24.8.05
amo uma mulher que não me ama,
escreveu num poema, porque em
palavra os factos lhe pareciam,
como sentir, rasgar menos para ferida. s. d’o.
23.8.05
se dialéctica. a falência dos gestos é sempre um princípio, mesmo que prenúncio ou confirmação de um fim. 3.
22.8.05
tendências e modos
cresce a urgência nas palavras. porém, é o silêncio
o que a vida reclama. s. d’o.
9.8.05
8.8.05
nas vésperas do verbo
o que era o modo, o único, fazia um património
de trevas, um véu de noite boreal, permanente.
era ainda o mesmo momento estendido a
eternidade, antes de o tempo existir,
contado.
o princípio não foi um flash.
as sombras foram enxotadas por
um jogo de asas forte, asas em negro,
varrendo um traço da escuridão
até o clarear e fazer um rasgo
branco. travada como fundo, nasceu
uma sombra bifurcada, circular.
duas províncias. a luz, aberta, ténue.
o lugar do princípio ainda não existia
havia apenas uma sequência concêntrica
de patamares, regra em fosso. no intervalo
entre os patamares, levantavam-se vapores
de enxofre. o cheiro era nauseabundo.
em todas as valas levedavam escamas de peixe,
penas, pústulas retiradas de feridas de carne,
entranhas e merda. o cocktail, na terra,
gerava uma febre fétida e flores cor azul navy.
ainda não havia limites naquele lugar.
nem loucura nem virtude. a primeira
fronteira foi construída sobre os uivos
de uma besta que repetidamente anunciava
o final das vésperas. o princípio
aconteceu depois.
depois da invenção do mapa
e do cronómetro foi possível
experimentar a luz. daí, talvez sábado,
nasceu o verbo. e começou a semana. s. d’o.
6.8.05
vacatura. há vazios que não são para preencher. 3.
5.8.05
o idílio urbano de constantino corbain
vi.
de onde promana a lágrima? que se vê.
ele regressou a casa. não quero o amor,
escreveu ele no seu moleskine. depois
de uma pausa, continuou, quero um corpo,
serventia para o fim. quero um corpo que jogue
a ausência, que me escape. apenas isso.
quero um corpo que não seja nem trunfo
nem triunfo. como uma gaveta fechada, onde
se escondem as cinzas. quero um corpo, não
quero o amor.
quero o amor. após escrever estas palavras,
traçou um longo risco. _______________________
assim, decidiu ele, haveria de acabar
aquela canção.
depois da decisão, inaugurou outro cigarro.
havia uma cidade lá fora para continuar
a dizer e a evitar. havia ainda amanhã,
certeza, não esperança.
certeza, não esperança. um corpo, não o amor. s. d’o.
4.8.05
no comments. coffee and cigarettes é
3.8.05
o idílio urbano de constantino corbain
v.
o tempo é um balcão absoluto. é sobre a sua
superfície que as cartas têm valor.
a partir de determinado momento, o jogo
começa a cansar. o sangue exulta em
desperdício, devolve o ritmo. e volta a ficção.
aquele amor nunca foi, nunca mais voltará
a ser. ele rende as cartas sobre a mesa.
levanta-se. sai. abandona o jogo, deixando
escrita uma interrogação no caderno. como
é que se
no chão jaz uma carta,
no chão jaz uma carta, o valete de espadas.
ninguém vê. s. d’o.
2.8.05
arqueologia. extrair a carne da pedra, até encontrar a forma oculta sob ela. 3.
1.8.05
o idílio urbano de constantino corbain
iv.
há um lugar, um lugar mulher, onde habita
a ausência, como uma vaga numa mesa
de jogo.
de jogo. nem a sorte nem a batota.
ele sabe. por mais emprestado à confissão
que o corpo seja, subsiste um resíduo
autêntico, um traço de sombra, um traço
de sal e sol, documento que não lhe permite
a redenção. apenas a paixão. joga-se
sobre aquela mesa.
acolhe a derradeira carta na mão. na
outra mão, a mais certa, segura um cigarro.
hesita. não quer ver o jogo. já sabe qual
é a penitência.
como ninguém, conhece aquele lugar. lugar
vazio, vazio de si, sem mulher. e começa
a imaginar.
a imaginar. se um escritor de canções joga assim
será para perder?, será para ganhar?
será para perder?, será para ganhar? a ressurreição
pelas mãos da croupier não explica tudo. s. d’o.
2004/2024 - serôdio d’o. & 3ás (escritos e subscritos por © sérgio faria).