30.9.06
28.9.06
26.9.06
da democracia. o hiato entre a instituição e o programa da democracia é o tensor que pressiona a instituição ao encontro do programa. 3.
23.9.06
da casa da culpa. a memória é o alojamento da culpa. apenas esse facto nos liberta e condiciona à liberdade, ao avesso. 3.
21.9.06
19.9.06
através da res existência, i. interrompe-se o hábito, mas subsiste a disposição, a propensão, o vício. 3.
16.9.06
da comédia. a comédia é a reedição, por imitação selectiva, dos vícios e das inclinações mortais indolores. 3.
14.9.06
12.9.06
9.9.06
do luto que será. um dia, pelo corpo, ela morrerá. no instante em que se souber do seu óbito, duas palavras que sobram de si constantemente, fulgor e falcão, eclodirão escritas. 3.
8.9.06
aparição flush
vii.
antes de os olhos assentarem, fixos, num lugar,
verga-se a paisagem pelo lançamento das mãos.
estremecem as coisas. acontece um frémito sobre o domínio,
coroa e colónia do que é. há quem observe o movimento
para investigar a força.
quase quieto, porém centrífugo, o corpo permanece grave.
a pressão cardíaca, enquanto gravidade, cai
sobre um único ponto. a cabeça colocada baixa,
unindo os sentidos aos sentidos. são os órgãos também
e entre eles o sangue e os fluídos, numa curva
sob tensão concêntrica. e são os braços armados,
estendidos. a cratera, a ferida. vê-se o rosto,
tocado e eléctrico.
fora, há ainda a dispersão dos elementos.
há corpos abertos, em procura, creditados
a um motivo divino. os outros. tudo é a substância
a desviar-se permanentemente para o centro.
há a vontade, há o eixo. consuma-se o fulgor.
a carne é um instrumento, a lâmina também.
a carne é um instrumento resumido numa
só matéria, si mesma. a lâmina, como o formão
é da terra, combina a carne sob um fio preciso,
o corte, o fio da união e da separação.
há quem observe o movimento e escreva, escreva
sobre o escrito, ressuscitando consecutivamente
pelo registo. espanta-o a reunião, o verbo errado e errante,
o som desarrumado, a composição. mas uma matéria única,
a carne, é o seu fulcro. s. d’o.
7.9.06
escala de salomão. há dois dispositivos de justiça incrustados no corpo, os olhos e as mãos. para além de uns e de outras, apenas são os equívocos e nenhuma jurisprudência. 3.
6.9.06
aparição flush
i.
quase nada e sou. sem céu me digo,
sem escolta, nascido assim, uno e
descalço, digo-me como quase nada se diz.
sem céu, também sem chão, sou cúmplice
e satélite de mim, quase nada. reforço,
quase nada.
aconteceu-me a primeira morte e a segunda morte,
a terceira anuncia-se. fico e digo, como digo,
o ímpeto da charrua de nenhuma quimera,
apenas da terra, terra chã e quieta, aparentemente morta.
solto as mãos à alfaia, para a conduzir. nenhum sulco
é meu ou vosso.
clamo todos os caminhos, todos os regressos. o sangue também.
já não recordo os campos como quando os repetia todos os dias,
ciclo após ciclo, presente. agora (e)s(t)ou diferente,
mas ainda o mesmo.
testemunho-me e, por quem, quase nada é o testemunho.
avulso e íntimo, comum, sem majestade, comungo
as circunstâncias. dizem que é o tempo, o nosso tempo,
e o efeito das constelações e do seu ritmo zodiacal. a vida.
não sei. aprendi que, neste território de actos e factos e erros,
a identidade é uma malha que nos envolve e devolve,
condição traduzida em tempo nosso, meu. mas não sei.
recupero, enquanto somos, sou. sustento-me como lapso eterno
e próximo. exactamente assim, a mesma culpa. quase nada
e sou. é isso, o meu caso e o que o alcança, o que lavro aqui.
e lavro-o pelo formão, até ser verbo. s. d’o.
5.9.06
cântico dos cânticos. combate após combate, muitas das ficções e das fixações que parametrizam as acções e as relações tendem a tornar-se insustentáveis. entre outros motivos, porque nenhum cântico previne o segundo dilúvio, não obstante a sua inexorável aproximação. 3.
4.9.06
as orquídeas
o roteiro era breve. atravessei o horto
sem me deter em pormenores. partilhei a palavra
contigo, a dois, numa solidariedade íntima,
sem mais testemunhas. tu disseste, eu disse,
sem a preocupação de dizer o que dissemos.
o branco das orquídeas era baço.
mais quase nada recordo dessa tarde.
o roteiro era breve. porém, repito,
mais quase nada recordo dessa tarde.
havia uma nespereira, havia uma macieira,
havia um pessegueiro, havia um limoeiro.
também havia uma mesa de pedra, sob a sombra
da nespereira.
aí, calando-me, quase me enganei.
era uma tarde, uma tarde apenas.
o sol caía maduro na frente, deixando
até si um rasto de tom torrado.
a noite, querias a noite, aquela noite,
recordo isso. mas, havia ainda a tarde,
não sei onde ficámos, se ficámos para a noite.
é por isso que, agora, porque não a acredito,
não digo a clareza nocturna daquele pomar.
repito, é porque não a acredito que não digo
a clareza nocturna daquele pomar.
o branco das orquídeas era baço. s. d’o.
2004/2024 - serôdio d’o. & 3ás (escritos e subscritos por © sérgio faria).