30.5.07
cartão de memória
ainda afastados, começamos a regressar
em visitas breves ao cheiro das paredes,
ao som do vento das noites de outono
contra os plátanos, ao ranger dos comboios,
ao pio da coruja, aos automóveis alternados
na avenida. ainda afastados, continuamos
a pertencer a onde partimos, a ser diáspora
no próprio corpo. s. d’o.
28.5.07
nostalgia
a solidão do que é muito do tempo entranhado
nas pedras. não sei. foi tanto o que não aconteceu.
não sei. é isto, inconcreto, o que há?, o que fica? s. d’o.
18.5.07
sentido e polaroids
ficha técnica, efeitos especiais,
identidade desconhecida, xis ou ípsilon.
ninguém na sala de cinema para a exibição
da película. modernismo demasiado, um motivo
como qualquer outro.
no écran, um grande plano, uma mesa. no meio
da mesa, um tabuleiro de xadrez, as peças
dispostas. a mesa é comprida e larga,
tanto que, desde qualquer das suas faces,
os homens não podem alcançar o tabuleiro
e as peças nele. pelo que, não obstante a vontade
dos homens, o jogo tem que acontecer no alcance
da imaginação que conseguem, se conseguirem. s. d’o.
16.5.07
instantâneos
a cada instante, e nós nele, muda mais
do que o instante. muda a identidade,
o reconhecimento, confirma-se o gasto
e a perda, a forma do tempo. a cada instante
renova-se o combo do desconhecimento
que nos atribui distância a nós, quem fui?,
quando fui, agora que sou.
a cada instante o rosto sucede-se, mesmo
e outro, como o mesmo se actualizasse outro.
assim é com o rosto, assim é com o rasto.
assim é direcção e sentido, corpo para oriente,
recordação que se acorda a si, cardeal,
soberana. porque a cada instante é a saída
e o reencontro, a permanência de agora
e a alteração, o esquecimento do que mudou
no instante que passou, porque agora o instante
é outro. agora o instante é outro. agora o instante
é outro. agora o instante é outro. agora o instante
é outro. agora o instante é outro. agora o instante
é outro. agora o instante é outro. agora o instante
é outro. agora o instante é outro. agora o instante
é outro. s. d’o.
a cada instante, e nós nele, muda mais
do que o instante. muda a identidade,
o reconhecimento, confirma-se o gasto
e a perda, a forma do tempo. a cada instante
renova-se o combo do desconhecimento
que nos atribui distância a nós, quem fui?,
quando fui, agora que sou.
a cada instante o rosto sucede-se, mesmo
e outro, como o mesmo se actualizasse outro.
assim é com o rosto, assim é com o rasto.
assim é direcção e sentido, corpo para oriente,
recordação que se acorda a si, cardeal,
soberana. porque a cada instante é a saída
e o reencontro, a permanência de agora
e a alteração, o esquecimento do que mudou
no instante que passou, porque agora o instante
é outro. agora o instante é outro. agora o instante
é outro. agora o instante é outro. agora o instante
é outro. agora o instante é outro. agora o instante
é outro. agora o instante é outro. agora o instante
é outro. agora o instante é outro. agora o instante
é outro. s. d’o.
14.5.07
domínio
se derrubo este pão, falta-me o vinho
e a carne, permaneço entre os espectros,
sem reino. confesso o corpo quieto, mais quieto,
tomado na sua ronda e vigiado. confesso-o quieto
entre as sementes e os frutos, entre as águas
e a febre. confesso-o impelido pelo sangue,
rastilho a ser, e, sem mais, não maduro,
com os pés sobre o chão, montando-o.
aí a terra gretada, também as arestas
onde o vento passa, lavrando, pelo sopro
em que vem, os flancos da seara. e é o corpo
quieto, ainda mais quieto, caminho
sobre o qual o vento continua. s. d’o.
se derrubo este pão, falta-me o vinho
e a carne, permaneço entre os espectros,
sem reino. confesso o corpo quieto, mais quieto,
tomado na sua ronda e vigiado. confesso-o quieto
entre as sementes e os frutos, entre as águas
e a febre. confesso-o impelido pelo sangue,
rastilho a ser, e, sem mais, não maduro,
com os pés sobre o chão, montando-o.
aí a terra gretada, também as arestas
onde o vento passa, lavrando, pelo sopro
em que vem, os flancos da seara. e é o corpo
quieto, ainda mais quieto, caminho
sobre o qual o vento continua. s. d’o.
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