28.2.05
26.2.05
vita nuova. no contexto da modernidade, a vida é o condutor e o amortecedor da dificuldade de ser. se. 3.
25.2.05
escrever adeus
um dia conseguirás o que
me rogas em silêncio, o
adeus escrito em acto. s. d’o.
24.2.05
o rasto dos gestos. as mãos vazias são o sinal que perpetua não a fome, mas a sua sensação cavada. 3.
23.2.05
lugares, ii
a margem é o rasto da
continuidade, lugar, de chão
híbrido, onde se encontram
os lugares. s. d’o.
22.2.05
never ending (hi)story. passado algum tempo, diminui a frequência e o alcance do improviso. paulatinamente, cada um começa a repetir-se. é isso ser. o que se é. narrativa constante. murmúrio sem interrupção. atingido esse limiar, já não se é. somos. e, ao repetirmo-nos, dilui-se a sensibilidade para a diferença. torna-se cada vez mais difícil sair de nós. ficamos. fechados. e assim somos. continuamos a ser. depois, paulatinamente, cada um começa a repetir-se. 3.
21.2.05
lugares, i
a esquina é o verso de um
cerco, lugar fechado do
mundo, onde as mulheres
passam soltas ou se aproximam. s. d’o.
19.2.05
closer, exercício para celulóide em plano close to me. há uma pergunta, e depois?, que não se faz antes da oportunidade, do tempo, do futuro. e o futuro, para além da condição de hipótese, acontece apenas quando o presente se confirma diferente do que anteriormente se admitiu ou desejou. 3.
18.2.05
se isto és tu, iv
às vezes, no modo como enuncias
o corpo, sabes-te os detroços da tua
própria conquista, porque és, dita,
a frase swing do outono que evitas. s. d’o.
17.2.05
if you wear that
16.2.05
se isto és tu, i
às vezes, no modo como precipitas
o olhar, sabes-te um vento com corpo
animal, fingido dissidência entre as
arestas dos objectos, fora das mãos. s. d’o.
15.2.05
(in)tangibilidade. as sombras, quando se encontram, não se tocam. apenas os corpos têm essa hipótese. 3.
14.2.05
o jogo có
a menina dançava à noite. durante a manhã
e a tarde lia adorno e benjamin. às vezes,
à tarde, também lia berlin. ele, porém,
desconhecia os hábitos dela. e parecia
saber apenas factos sobre futebol.
à noite, muitas vezes se olharam, ele cobiçando-a,
ela suspeitando dele, das suas intenções
feitas nos olhos.
mas uma noite ele avançou. danças?, perguntou-lhe
para confirmar, ao mesmo tempo que, materializando
o convite, lhe estendeu a mão. ela não respondeu.
nem à pergunta nem ao gesto. continuou a fumar o
cigarro, certa, parecendo, como costume, esperar
que lhe fosse servido um café. naquela noite,
o café nunca lhe foi servido. ela apenas não
quis dançar com ele. pois sabia quase nada saber
sobre futebol. e não queria penhorar, assim,
à noite, perante ele, a sua ignorância sobre
as coisas concretas da vida. s. d’o.
12.2.05
limiarma. é ainda a ironia que sobrehá quando, por qualquer motivo anterior ao reduto da consciência, alguém está disponível para se investigar ou comprazer com a(s) dúvida(s). 3.
11.2.05
pêndulo. trapézio. trampolim. menina. e ping. e pong. e, depois, o lado oposto, o verso. das coisas. dos modos. dos gestos. dos tons. das palavras. dos corpos. das modas. do mundo, mundo todo. mundo que cresce dentro de si. para um lado e para o outro. numa oscilação a que não se conhece o ritmo. s. d’o.
10.2.05
nada. é o princípio do preenchimento, uma fisiologia do ser a estender-se para ser. 3.
9.2.05
as mãos encontradas
falha a espiral, nada mais.
e começam a falar. não se ouvem
as suas palavras. vêem-se somente
as suas mãos, suspensas e marcadas
noutro espaço. percebe-se o perigo
de serem mostradas, assim. dadas,
cruzadas no mesmo laço. s. d’o.
8.2.05
sombra. a vida é o exercício, o ensaio de hipóteses. daí que a dúvida seja uma espécie de paixão, simultaneamente impregnada no corpo e estranha a ele. e daí que ninguém acredite no oogie boogie man que é antes de se sentir acompanhado ou perseguido pela própria sombra, sombra que é o traço da identidade que, no contraste de luz, enuncia a alteridade. 3.
7.2.05
ways of worldmaking
gostava ele de polaroids e
coleccionava-as. sabia ele que,
por elas, guardava vida, a vida
como suspensa num momento,
momento exacto, sub specie
aeternitatis. e sabia ele que cada
polaroid era um retrato do mundo,
todo, sintetizado num tempo inteiro
de si, único, irrepetível, do qual não
há testemunhas. s. d’o.
5.2.05
a grei sideral. segundo swedenborg, aos anjos, em conjunto, chama-se paraíso. “angeli simul sumpti dicuntur cælum, quia constituunt illud; sed usque est divinum procedens a domino, quod influit apud angelos, et quod recipitur ab illis, quod facit cælum in communi et in parte”. 3.
4.2.05
3.2.05
os monstros são nossos amigos. se fosse homem, escolheria entre cila e caribdes, como quem escrutina ventos e marés. se fosse deus, escolheria entre behemoth e leviathan, como quem sorteia o chão ou as vagas. é esta, por ser a mesma, a roda da fortuna onde a humanidade e a divindade jogam os seus fantasmas. 3.
2.2.05
oito desenhos de paisagem
i.
a filigrana cortada na terra e a semente
nela desperdiçada.
ii.
a pele horizonte, o perfume pedra
manchado e o lugar aberto para
o interior de um espaço longínquo.
iii.
a silhueta do gesto morto ainda em
perseguição à sombra que foge.
iv.
a carne jogada como memória
dos famintos.
v.
o corpo, em dança, escrito,
a lápis, num moleskine.
vi.
o perímetro de uma palavra
a enunciar o limite, o silêncio,
a ensaiar a oscilação do fio
que aproxima, por trazer,
o mundo.
vii.
o soberano que procura construir
o chão e sobre ele ditar todos
os princípios cuja eternidade
o tempo permita fazer sítio.
viii.
as mãos ditas o domicílio inocente
do corpo e nelas a sua medida
e o seu alcance sempre inaugurado. s. d’o.
1.2.05
variação sobre um tema de austin (entwined)
corpo rendido. três vezes se negou o corpo à companhia, ao (re)conhecimento de si. 3.
2004/2024 - serôdio d’o. & 3ás (escritos e subscritos por © sérgio faria).