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almanaque de ironias menores

caderno de exercícios avulsos e breves, por serôdio d’o. & 3ás 

29.6.17


propedêutica, ii


da pureza prevalece a crueza.
que esta morada seja apesar
dos destroços. s. d’o.

referência

27.6.17


exercício de rescaldo


e tu, no teu completo, quem és?
pareces ninguém, se alguém
que conheci tão bem. s. d’o.

referência

22.6.17


propedêutica, i


não há substância, apenas condição.
criaturas estranhas precipitam-se
para o retrovisor. passa o tempo,
cresce nas coisas, passam também,
levando consigo o nome que não encontram.

no reino de amanhã, o nosso, continuará
a não a haver deus como é. s. d’o.

referência

20.6.17


canção de amigo, x


adormeço virado para o teu lado.
não estás, eu também não. s. d’o.

referência

15.6.17


“cada um é tentado pela sua própria concupiscência, que o atrai e seduz. e a concupiscência, depois de ter concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, uma vez consumado, gera a morte.”*

totus tuus


para que é o corpo?, para descobrir-se, ser solto
de si, para ser prova das provas de abandono
e de contacto, mais do que habitação, do que écran,
hematoma, mais do que traumatismo, metástase,

do que cabeça, tronco e membros, termo de fome
ou outras admoestações. goodbye soft machine,
adiós maquina blanda, auf widersehen weich
maschine
, au revoir machine molle. o choque


é frontal, a velocidade proibida, a da libertação.
adeus máquina macia. a salvação, que salvação?,
será pela tesão. olá, bone machine. e desta saudação

acontece réplica em línguas de escala ou de destino
diferentes. não sou eu que estou aqui. outra morte
chama, pode dizer-se, outra morte chama por mim. s. d’o.
____________________
* versículos catorze e quinze do capítulo primeiro da carta de tiago.

referência

13.6.17


vereda


os membros assentes no desequilíbrio.
o teu coração, tão alavanca quão ponto
de fuga, soltei-o. o chão range. tenho pé,
tenho mão, embora agora, seguro, não.

mantém-me a morte, traz-me o vão,
nada que valha mistério ou oração,
nada por que seja vaso ou salvação,
porque, o que continua a ser, é ainda
peregrinação, tu a mesma direcção. s. d’o.

referência

8.6.17


a espera intacta


a espera intacta, o sentimento que combina
na fractura, recomeça o que não pode ser
negado e que, por ímpeto sanguíneo, há-de
concretizar-se pela detença. e por ela,
mais tarde, ainda tarde, no dia último
que todos os dias são, cometo o teu nome,
um espectro que compreende outro, sem conseguir
a ilusão de que basta a palavra para dizer-te.

peço o que foi para que seja. amo-te na cruz,
só e tanto. s. d’o.

referência

6.6.17


canção de amigo, ix


fosse, porque é, a hora derradeira, a do exílio
que soma a vaga a falta maior e inteira,
a tua. acuso-me. erro a palavra de acolhimento,
a hipótese de passe, tudo, talvez tudo outra vez.

não fui eu que inventei o amor. não sinto consolo
ou contrição por isso. sinto apenas o que sobra,
ninguém. s. d’o.

referência

1.6.17


canção de amigo, viii


mea culpa, felix culpa, outra. preencho o cadastro
com convicção. não me arrependo de continuar
a amar-te, se tal me suja. nunca presumi inocências.
habituei-me a isso, religião barata.

insisto na requisição, promete-me que morres
ou mais, o engano. s. d’o.

referência

2004/2024 - serôdio d’o. & 3ás (escritos e subscritos por © sérgio faria).