19.11.10
itinerário da devolução
daqui vejo que já não estou
e que por não estar não sou
aqui. assim começo a nostalgia,
o caminho que consigo perder. s. d’o.
17.11.10
camuflagem
de que outro modo a transgressão poderia ser
sagrada? mais um demónio doméstico,
mais uma verdade diante da qual ela ri,
mais a intriga, a manipulação, o sofrimento
e nada disto é matéria para resolver o enigma.
o protocolo recomenda, abram a bilheteira
mais cedo, mas não abrem. vamos chegar
atrasados, não faças perguntas, já saímos
do prelúdio da aceleração. guarda a navalha. s. d’o.
15.11.10
5.11.10
leopardo ferido na asa
no sonho americano não entram leopardos. no sonho europeu
também não. mas quem - o pronome é pessoal - vem lamber
os vasos sacrificais, é assim que o ritual é anunciado desde kafka,
são os leopardos. vêm pelas horas estrangeiras, pela escrita
fantasma, pelo que acontecerá. os leopardos continuam a vir
e a entrar, um leopardo ferido na asa à frente, os outros depois.
em dias de ácido, o manicómio parece um jardim, pétalas
caídas no chão, beatas fumegantes entre elas, uma paisagem
como se fosse sob um vulcão, a fuligem e a cinza debaixo dos pés,
a garrafa vazia. uma garrafa vazia é sinal para partir, vidros,
uma onda de calor que parece um vulto, um génio sem forma,
saído da fornalha. quantos desejos concederá? s. d’o.
3.11.10
mãos a marte
não espanta que estejamos a regressar ao cálculo
dos danos, a colcha não está sobre a cama. é inverno
ou não passamos devagar. as horas, as horas desconhecidas
começaram mais cedo. está frio e eu estou a falar sobre ti
para conhecer-te melhor e esquecer-te. s. d’o.
1.11.10
mala carne
o passo terceiro o sexo as drogas a lassidão moral
a beleza as mãos a alagá-la o vampiro
operações secretas mulheres sublimes com asas pequenas
têm os cornos nos cotovelos doem-lhes s. d’o.
2004/2024 - serôdio d’o. & 3ás (escritos e subscritos por © sérgio faria).