22.8.08
veredas para depois, vi
ao princípio, sobrante, é a amputação,
a cesura que faz a falta. depois é a sequência
amanhada pela levada do tempo, a sutura
que, através da recuperação dos seus avulsos
anteriores, permite recompor o que surge
novo. porém, com a perda, o novo não é,
não será, porque a morte não permite desperdiçar
o que foi antes. s. d’o.
20.8.08
veredas para depois, v
dos que foram, fica a sua continuação
como lugar eterno, que a detença consome
e restitui à visita, para não permitir
o esquecimento do que foi. e assim continua
a dor, pelo que já não é. s. d’o.
18.8.08
veredas para depois, iv
primeiro alcança-se a culpa, sob a forma de peso.
depois chega a confirmação, crespa no modo
que é a sobrevivência. e o que não é dito, no tempo
continuado, é a usura da memória, o passado
acrescentado, como condenação e perseguição.
aberta uma fresta na carne, o vazio preenche-a
consigo, atraindo ainda mais o que foi,
quase esgotando a hipótese de prolongamento
por senda diferente daquela que o tempo fez decreto
e acabou. s. d’o.
8.8.08
veredas para depois, iii
ao dizer essa enfermidade não é de morte,*
ele foi a quem não entregou a espera
ou a súplica. a cobrança foi adiada apenas,
sem resolver o luto, porque não há prazo
que ultrapasse a demora que o tempo preenche
sem volta. s. d’o.
__________
* evangelho de são joão, capítulo onze, versículo quatro.
6.8.08
veredas para depois, ii
e depois?, depois é a recolha dos retalhos,
a reconstituição do elenco dos detalhes,
a tentativa de os guardar num posto
da memória, para iludir o poço da falta,
a omissão continuada. s. d’o.
4.8.08
veredas para depois, i
ao iluminar-se a morte, situada num plano
necessariamente adiantado ou estranho, percebe-se
o caminho pelo qual será o regresso possível,
porém nunca consumado. de depois não há retorno,
eterno ou outro. s. d’o.
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