15.6.07
o uivo, ii
nesta estepe não há berços ou litorais,
não há imediato ou longo ou depois.
que cessem, pois, as orações. ficaremos
aqui. o nosso pasto será de carne. s. d’o.
13.6.07
o uivo, i
agora, que agora?, antes do meio-dia,
imagino a estepe do tempo, onde me vingo
lobo que espera a noite e não tem piedade
por quem perdeu o amor ou qualquer outra
carne ambulante. s. d’o.
11.6.07
o poema perfeito
foi uma promessa para a perfeição,
um contrato mais do que de estética,
tu não escreverias a palavra pétala,
eu não escreveria a palavra punhal,
e, assim, o poema sobreviveria-nos. s. d’o.
1.6.07
a senda do avesso
não estou a pensar, não posso pensar. também
não sei as minhas mãos, perdi-lhes o controlo
e o consolo. não é a derrota ainda, é o seu prenúncio
apenas, a sua antecipação.
um dia habituamo-nos a procurar atrás
das coisas e, se têm paradeiro desconhecido,
é aí que as vamos procurar, insistindo
na sua sombra. a habituação à perda
necessita desta manobra. é um acto fácil,
para o desperdício. não é distante do corpo,
não lhe é estranho. aliás, quando aí se habita,
o silêncio transforma-se em lugar, um lugar
como o passado sobre o qual escreveu
l. p. hartley, the past is a foreign country:
they do things differently there. e depois?,
sim, depois, que fazer?, esta é a pergunta.
regresso. a embriaguez que me embala não é
um barco. também não é inveja. eles são novos,
com o corpo permanentemente acordado. é o seu
primeiro amor, cada dia é seguro, sentem-no.
mas um dia, próximo, habituar-se-ão a procurar
atrás das coisas, a espreitar onde estão as sombras,
as mesmas que agora já consigo ver. s. d’o.
2004/2024 - serôdio d’o. & 3ás (escritos e subscritos por © sérgio faria).