30.9.05
nó
o nexo é breve. constelação, teias de água
ceifada. as mãos tremem exactas
nos objectos. caem. o gesto é lustral.
sobram vestígios de um segredo. mão nenhuma.
começa o corpo, página a página, como
tecido. acompanha-o a voz. o nexo é breve.
depois, o nó desfaz-se. s. d’o.
29.9.05
reflexo condicionado. a citação desta cena no espelho de cena não é repetição, mas confirmação de si-mesma. 3.
28.9.05
o caminho dos lobos
havia as vozes. súbito, dentro,
calaram-se. abriu-se aí, sobre o silêncio,
um novo lugar. uma alcateia surgiu.
sangue. porém nenhum indício de luta.
lágrimas. porém nenhum sinal de dor.
a paisagem fez-se um volume, solidão,
restaurado no corpo. deixaram de obedecer,
as mãos. as asas também.
depois, de tanto bater no corpo,
o vento, despindo-o, talhou uma pedra.
e os lobos, sedentos, avançaram
para o horizonte. carne!
continuaram caladas.
27.9.05
sete. em à boute de souffle, realizado por jean-luc godard, há uma cena em que patricia mostra tantos dedos quantos os pecados que matam. nesse instante sabe-se que a culpa não é conceito abrigado naquele lugar. 3.
26.9.05
extinção
porquê a noite?, porque são nocturnas
as coisas simples, sem nome.
os aromas. as texturas. os corpos.
os rumores. os ruídos. as sentenças.
os espectros. o vento. a luz. a voz.
o excesso, arrumado em sombras.
as confidências. a proximidade. e deus,
dito por vários nomes, nenhum nome absoluto,
nenhum nome de deus, único. s. d’o.
24.9.05
a vã guarda. em die jetten jahre sind vorbei, realizado por hans weingartner, a intenção de redimir o mundo anima um desvio dos gestos que confirma a hipótese de redenção do mundo através da confirmação desse mesmo mundo. 3.
23.9.05
aqueles que a noite despoja
os que padecem a aurora,
que sofrem o estreito nocturno. neles,
o sangue negro do sono, sem alma
ou polaroid. o navegador absurdo, tempo
escolhido, sem memória para vender
ou ser aguarela. sonho?, talvez.
e uma sinfonia sem vozes.
e um bosque sem discípulos, sem fortuna.
a marca indelével do sopro. a morte branca.
o conforto da insânia. o encosto. o regresso.
a noite não avança. a noite não passa.
culpa?, culpa de estar aqui?, o que é? s. d’o.
22.9.05
escala de sonâmbulo. em antonin artaud, a consciência é um vazio preenchido com nada. 3.
21.9.05
20.9.05
sopro interior. pela fotomontagem le phénomène de l’extase, composta por salvador dalí, percebe-se que em cada corpo se repete o excesso que consome os corpos e os devolve à sua própria face. 3.
19.9.05
17.9.05
corpinteiro. o corpo, absoluto, não se diz. 3.
16.9.05
coreografia em dor calada
dança o espectro do silêncio
(no interior). o corpo cai
(por fora). e o ritmo ergue-o. s. d’o.
15.9.05
poéticas. o poema mais preciso é aquele onde as palavras são os gestos, pelas mãos e pelos lábios, e nenhuma palavra se diz. 3.
14.9.05
a última perseguição
já não sei a vertigem nesta
distância. as minhas mãos
são inúteis. morro descalço.
e sem fé. s. d’o.
13.9.05
caminhos. de um lado, o eterno afecto. do outro lado, a desconfiança. o caminho, entre um e outro flanco, mata. e não se sabe a que destino conduz. são tensões e incógnitas como estas que abrem a vida. 3.
12.9.05
loopinglove
amanhece-se sem corpo. repete-se
o erro. a mesma paixão, o mesmo
rebate, o mesmo chão. deus não
faz destinos assim, precisos,
exactos.
na casa, o cheiro da vontade,
sem tempo dormido, vigilante.
vontade acesa, não enganada.
a vontade não se engana.
e depois a paciência. para escrever,
em tranquilidade, o que já não devia
ser escrito. amo-te. mas que se repete,
quase única ordem, quase única sentença,
em regresso permanente. s. d’o.
10.9.05
boletim metereológico. ´´´c´´´´´
boletim metereológico. ´´´h´´´´´
boletim metereológico. ´´´´o´´´´
boletim metereológico. ´´´´´v´´´
boletim metereológico. ´´´´e´´´´
boletim metereológico. ´´´´´´´´´
boletim metereológico. ´´s´´´´´´
boletim metereológico. ´´´o´´´´´
boletim metereológico. ´´´´b´´´´
boletim metereológico. ´´´´r´´´´
boletim metereológico. ´´´´e´´´´
boletim metereológico. ´´´´´´´´´
boletim metereológico. ´´´´´´´e´
boletim metereológico. ´´´´´´s´´
boletim metereológico. ´´´´´t´´´
boletim metereológico. ´´´´´´a´´
boletim metereológico. ´´´´´´´´´
boletim metereológico. ´´terra´´´. 3.
9.9.05
página do livro das sinestesias
tudo o que se vê.
nada o que se toca.
apenas os fracos regressam
ao mesmo engano. s. d’o.
8.9.05
sequência de liberdade. primeiro cai-se. depois voa-se. contra o chão. 3.
7.9.05
6.9.05
verdade ou consequência. pode omitir-se a verdade. pode ocultar-se a verdade. pode iludir-se a verdade. pode negar-se a verdade. não pode, porém, anular-se o seu efeito. por mais invisível, silencioso e íntimo que seja. em quem omite, oculta, ilude, nega a verdade. ou em quem, depois da omissão, da ocultação, da ilusão, da negação, encontra essa mesma verdade. 3.
5.9.05
3.9.05
reflexividade. o reflexo mais exacto de alguém é a sua sombra, não as suas palavras. 3.
2.9.05
cor de amor quando foge
trocamos perguntas, não respostas.
falecem-me os braços, tenaz em que
o teu corpo, quiseste, tantas vezes
foi fechado.
a ausência desenha-me o teu rosto,
faz-me a necessidade dele. sinto as
mãos nuas, sem forma, dobradas
sobre as linhas que não são o
teu corpo. revejo-te despida, com
os lábios que beijei, dada em
sequência à alma, a consumires-te
no meu engano, na fuga.
foi aqui que te amei. é ainda aqui
que te amo. sento-me na margem
deste lugar. vou esperar. talvez
morrer.
amo-te. a noite é estar contigo. s. d’o.
1.9.05
rien ne vas plus. universo de enganos e de desenganos, lugar onde não há croupier, o mundo é simultaneamente a plataforma do jogo regrado e da batota. 3.
2004/2024 - serôdio d’o. & 3ás (escritos e subscritos por © sérgio faria).