passagem para o exílio
várias casas. aquela era a última,
tão derradeira e afastada quanto a última
casa do mundo. adiante era além, extensão
por uma linha que parecia entrar e ultrapassar
o horizonte.
o que parecia, porém, permanece conjectura apenas.
ali começava o que era longe, a frenteinabitada.
pelo caminho, que tangia a casa, chegavam
os hóspedes ocasionais. muitos chegavam
sem mantença, com as orações esgotadas.
a fome trazia-os crus e mensageiros
de penhor eterno de um credo. caíam
sob a sombra e, por repasto, satisfaziam-se
com o dulçor da polpa das maçãs. acreditavam
e queriam acreditar.
mãos de versos áticos acolhiam o fruto
e passavam-no aos hóspedes. esse gesto
findava a comunidade. os recém chegados
saciavam-se e prometiam partir. nunca
alguém cresceu ali.
o trabalho de calcorrear aquele caminho
levantava os corpos. pelos passos compreendiam
a solidão e dirigiam-se para a sua confirmação.
o silêncio transportava-os, face a face,
para si. sempre acordados, hausto para
o demónio os tumultuava, separavam-se
por categorias do zodíaco. era uma tentativa
vã de, assim, se repararem.
os hóspedes chegavam e partiam. o silêncio,
como prelúdio, era a sua aproximação. nenhuma
vizinhança demorava. e à única proximidade
certa e permanente, os abutres, os que chegavam
chamavam anjos da guarda.
quando partiam, para o regresso, conduzia-os
já a lição dos perdidos. haviam aprendido
a calar-se e calados iam. primeiro por vício,
depois por hábito. s. d’o.